Admito que escrever sobre “qualquer coisa e a pandemia” virou lugar comum nesses últimos meses. Não é para menos. O novo coronavírus impactou tudo e todos no nosso planeta.
Porém, por ser uma área pela qual tenho profunda admiração e até relativa interação em nível profissional, não poderia deixar de registrar algumas considerações sobre os avanços nos desenhos e projetos de produtos e ambientes decorrentes da necessidade das diversas mudanças de comportamento que fomos impelidos a adotar.
Particularmente, prefiro ambientes claros, minimalistas e funcionais, se possível sem muitos ornamentos, adornos, penduricalhos, balangandãs, bibelôs de toda sorte, além de tapetes, carpetes, cortinas, rendas, drapeados e todos seus congêneres. Aquelas camas com 18 travesseiros me causam arrepios só de imaginar a trabalheira diária para arrumar e desarrumar o look.
Como dito, é uma opção pessoal, e realmente respeito quem se identifica com o reality show “Acumuladores”. Definitivamente não serve para mim, mas respeito.

Felizmente, as minhas preferências estão alinhadas com as práticas mais saudáveis e recomendadas pelos profissionais da saúde, na medida em que evitam pontos de sujeira, focos de ácaros, bem como criadouros de bactérias e outros terríveis nano-monstros.
Voltando ao tema proposto, e estudando um pouco mais o assunto, percebi que, ao longo dos anos, a saúde e os aspectos ligados à sua manutenção passaram a ter um peso significativo nas questões ligadas ao design dos ambientes e produtos.
Para começar com um item básico na maioria das edificações modernas, a patente britânica nº 814 de 1775 descrevia a primeira privada com perfil em S, destinada a bloquear os indesejados odores advindos dos resíduos humanos e foi concedida para o escocês Alexander Cumming. Na época, micróbios ainda não eram sequer conhecidos, e os miasmas (denominação aplicada às impurezas existentes no ar detectáveis pelo mal cheiro) eram tidos como as fontes de doenças e epidemias, de modo que a sua eliminação foi extremamente bem vinda pela sociedade na época.

Outra revolução no design especialmente voltado para questões de saúde está na construção do Sanatório Paimio, localizado na cidade de Paimio na Finlândia e projetado pelo arquiteto Hugo Alvar Henrik Aalto. O prédio foi concluído no ano de 1933 e especialmente pensado para receber pacientes de tuberculose, tendo se tornado um ícone no tratamento e recuperação dos enfermos.

Totalmente diferente dos ainda sombrios hospitais do início do século XX, o sanatório Paimio se notabilizou por adotar grandes janelas que facilitavam a iluminação natural, e espaços amplos que promoviam uma melhor circulação de ar. O branco era a cor dominante, para facilitar a limpeza, as pias foram desenhadas para evitar respingos e as maçanetas eram compridas, para serem abertas até mesmo com o cotovelo se isso fosse necessário.

O nível do detalhe estava até mesmo em móveis como a cadeira Paimio, comercializada ainda hoje, na qual os pacientes de tuberculose podem se sentar e respirar com mais facilidade, provida de um encosto com angulação adequada e aberturas para ventilação das costas do usuário.
Enfim, o Sanatório Paimio quebrou paradigmas e influenciou fortemente os projetos de ambientes hospitalares que vieram em seguida.
Na atual conjuntura social, inaugurada no ano de 2020, estamos novamente diante da necessidade de pensar e repensar, com mais afinco, comportamentos, ambientes e objetos de modo a evitar a transmissão de um novo vírus e reduzir os estragos causados pela doença a ele associada.
Todos já notamos mudanças simples e, ainda assim, muito importantes em itens do cotidiano, como divisórias de mesas, totens para medição de temperatura e liberação de sanitizantes, marcadores de espaçamento em filas e escadas rolantes, dentre outros.

Infelizmente (ou felizmente, para o bem da nossa evolução), estas mudanças não são suficientes. Ainda frequentamos ambientes como cinemas, espetáculos, clubes e estádios, nos locomovemos diariamente em latas metálicas normalmente abarrotadas de pessoas, como ônibus, trens, metrôs, aviões e barcas.
Tudo isso precisa e deve mudar nos próximos anos, mesmo porque os cientistas já alertaram que fatores o aquecimento global, a poluição atmosférica e dos oceanos, o desmatamento das florestas e os maus tratos aos animais atuam como catalisadores de doenças e o timer para a próxima pandemia já está tiquetaqueando.
Portanto, o século 21 ainda promete muito no que diz respeito a inovações no design de produtos, com vistas a torná-los mais seguros e mais amigáveis do ponto de vista ambiental, combinando funcionalidade, estética e solução de velhos problemas.
Esse movimento começa já nas residências, reformuladas dentro das possibilidades de cada um para comportar ambientes de trabalho. Isso, por si só, tem o potencial quase incalculável de (i) reduzir as emissões de veículos movidos a combustíveis fósseis; (ii) melhorar a qualidade de vida de trabalhadores, com uma substancial economia do tempo em que passam em transportes públicos; (iii) evitar a aglomeração nestes transportes; (iv) promover uma ocupação mais equilibrada do território urbano; e ainda (iv) potencializar o crescimento do comércio e dos negócios em outras regiões mais afastadas dos grandes centros.
Na mesma toada, escolas precisam ser repensadas em diversos aspectos, sem eliminar o necessário convívio social de nossas crianças e adolescentes; empresas de ônibus podem suprimir catracas que as pessoas precisam manusear e desenvolver protocolos simples para higienização das barras de apoio; e as classes econômicas das aeronaves devem ser alteradas para permitir que possamos simplesmente usar nossos braços e pernas.

Enfim, muito progresso já foi visto até aqui, e muito mais está por vir. A empolgação e a expectativa com as novidades são sempre altas e a possibilidade de acompanhar isso tudo de perto, contribuindo para que os inventores e designers protejam legalmente as suas criações é um privilégio.
(imagens capturadas na Internet)